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Notícias e análises sobre economia política internacional e comércio exterior

A estratégia esperta para aprovar o acordo UE-Mercosul

Ao enviar a parte comercial do pacto para ser ratificada primeiro, contornou-se o risco de demora da aprovação por cada país do bloco, diz Lucas Ferraz

Por Diogo Schelp Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 12 set 2025, 11h05

No início do mês, no último dia 3 de setembro, Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, apresentou formalmente a proposta do acordo entre União Europeia (UE) e Mercosul, que agora vai para uma delicado processo de ratificação, dividido em dois: um, mais rápido, que diz respeito à redução de tarifas de importação e que depende apenas da aprovação do Conselho Europeu e do Parlamento Europeu; e outro, mais demorado, que abrange o acordo como um todo.

Os analistas mais otimistas avaliam que a primeira fase de ratificação pode ser concluída já este ano, com o início da implementação das medidas tarifárias previsto para os próximos meses. Entre os que acreditam nessa perspectiva está Lucas Ferraz, economista da FGV-SP, que participou das negociações para o acordo com a UE na qualidade de secretário de Comércio Exterior do governo federal entre 2019 e 2022. “O acordo vai integrar a indústria brasileira às cadeias de valor regionais da União Europeia, trazendo ganhos de competitividade”, disse Ferraz na seguinte entrevista à coluna:

Como o senhor avalia o texto final com a proposta da Comissão Europeia para o acordo Mercosul-EU, que agora segue para ratificação, em especial no que refere aos adendos que foram feito para reduzir as resistências do setor agrícola francês?

Meu entendimento é que essas salvaguardas agrícolas já haviam sido negociadas. O que a Europa discute agora, internamente, é o mecanismo que utilizarão para fazer as investigações e acionar as salvaguardas.

São mecanismos internos, assim como o Mercosul terá os seus. Não se trata de renegociar nada. São questões internas para apaziguar as preocupações da França, Áustria, Polônia, Irlanda e Itália — países com setor agrícola vocal que, nessa altura, busca extrair algum benefício adicional da Comissão Europeia.

Trata-se mais de uma movimentação interna visando a algum tipo de pacote de subsídio adicional. Mas nada que ameace a aprovação do acordo até o final do ano.

A grande resistência francesa foi vencida. O presidente Emmanuel Macron busca uma saída honrosa para uma posição que defendeu desde o início, contrária ao acordo. Mas ele também enxerga que o mundo precisa diversificar parceiros comerciais e reduzir a dependência dos Estados Unidos.

Mesmo com as salvaguardas, o acordo é bom para o Brasil, especialmente para o agronegócio?

Sim, o agro brasileiro ganha. É importante colocar em perspectiva: as salvaguardas são bilaterais. O setor agrícola é nosso interesse ofensivo — onde temos vantagem comparativa. Nosso setor defensivo é o industrial, onde eles têm vantagem.

Negociamos uma salvaguarda no setor automotivo quando o acordo foi reaberto no governo Lula. Em 2019, quando concluímos o acordo pela primeira vez, não havia salvaguardas. Era um acordo mais liberal, digamos assim.

Por mais que exista o temor de que a União Europeia possa acionar salvaguardas contra exportações agrícolas brasileiras, fato é que os europeus também podem sofrer salvaguardas do lado industrial. Essas coisas se equilibram.

Da oferta agrícola para a União Europeia, 19% do que exportamos terá cota — carne bovina, frango, açúcar, etanol. Outros 77% são tarifas que serão desgravadas gradualmente em 10 anos, sem cota, até chegar a zero.

É claro que poderia ter sido melhor, mas quando você observa que a União Europeia é muito protecionista no setor agrícola, o que ela ofereceu ao Mercosul é mais do que geralmente oferece para outros países.

Quais são os principais benefícios do acordo?

Estamos falando de um mercado total de 22 trilhões de dólares e 718 milhões de habitantes — boa parte formado por consumidores de alto poder aquisitivo. Vai ser o maior acordo de livre comércio do mundo.

O acordo vai integrar a indústria brasileira às cadeias de valor regionais da União Europeia, trazendo ganhos de competitividade. Nosso café, por exemplo, que está sendo taxado em 50% para entrar nos Estados Unidos, vai se beneficiar com a abertura maior ao mercado da UE, que hoje já é nosso segundo maior destino.

Frutas do Vale do São Francisco poderão ser redirecionadas para esse grande mercado. O acordo praticamente dobra o acesso de exportações brasileiras com tarifas preferenciais — de 13% para cerca de 28% do total exportado.

Num momento em que o multilateralismo e o comércio baseado em regras estão sendo atacados pela principal economia mundial, este acordo envia um sinal de que o multilateralismo permanece vivo, ainda que num mundo mais fragmentado.

Como será a implementação?

O acordo foi concluído em dezembro de 2024. Fizeram a revisão legal dos textos e tradução para diferentes idiomas da União Europeia. Foi apresentado para um grupo de comissários, que já deram o “ok”.

Agora a Comissão Europeia está reunindo condições políticas para garantir aprovação no Conselho Europeu por maioria qualificada e no Parlamento Europeu por maioria simples.

Fizeram uma separação inteligente: só a parte comercial será votada primeiro, não a política. Isso evita que essa parte do acordo tenha que passar pelos parlamentos individuais de cada país da UE, o que levaria anos.

A redução de tarifas pode começar já no ano que vem?

Sim, é possível. Os produtos europeus têm cestas de desgravação de até 10 anos. Produtos com mais sensibilidade política são liberalizados em prazo mais longo.

O Brasil, como país em desenvolvimento, tem mais sensibilidades setoriais na indústria. Reduzimos tarifas em cestas de até 18 anos — é o caso dos carros elétricos. O Brasil libera 82% de suas linhas tarifárias em até 10 anos e 9% em até 18 anos.

Por exemplo, automóveis hoje têm tarifa de 35%. Essa tarifa será reduzida gradualmente até zero em 15 anos.

O acordo também afeta exportação de serviços?

Sim, mas nesse ponto poderia ter sido mais agressivo. Este é um acordo negociado há 25 anos, quando serviços não eram vistos como relevantes. Hoje é o comércio que mais cresce no mundo.

No Brasil, os serviços representam 70% da economia. De cada dólar que exportamos de produto industrial, 40 centavos correspondem ao pagamento de serviços.

Conseguimos avanços importantes: abertura da cabotagem do Mercosul para navios europeus, cláusula sobre comércio digital impedindo taxação de transmissões eletrônicas, e o “standstill” — congelamento da regulamentação atual, impedindo retrocessos protecionistas.

Mas de forma geral, poderia ter sido feito mais. É um acordo com cara tradicional do GATT (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, firmado em 1947, base para a formação da Organização Mundial do Comércio em 1995), focado em bens e tarifas. Na parte não tarifária, poderíamos ter sido mais agressivos.

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