 
                A eleição de Donald Trump tem implicações importantes em várias dimensões. Na esfera econômica traz desafios consideráveis para vários países, inclusive o Brasil. Em primeiro lugar, sua promessa de elevar tarifas de importação deve ter ao menos duas consequências sérias. A mais visível delas é o provável aumento dos preços dos produtos americanos que competem atualmente com os importados, com impactos razoavelmente rápidos sobre a inflação. É bem verdade que a redução das importações dos Estados Unidos fortalecerá o dólar em relação às demais moedas, mas é difícil que chegue ao ponto de compensar totalmente o efeito das tarifas.
De forma menos visível, mas não menos relevante, haverá perda de eficiência econômica, difícil de estimar a priori, ao atrair recursos (mão de obra, capital) para setores que hoje não têm condição de competir internacionalmente, fenômeno, aliás, bem conhecido por aqui.
Em ambos os casos, isso dificulta a queda da inflação em direção à meta, mas as medidas não param nisso.
No que diz respeito às contas públicas, espera-se aumento do déficit federal. De acordo com o Comitê para um Orçamento Federal Responsável, órgão apartidário, o impacto esperado das políticas propostas pelo presidente eleito é da ordem de 7,5 trilhões de dólares no período 2026-2035, média anual próxima a 2,5% do PIB nos últimos doze meses, de 28,8 trilhões.
O impulso fiscal adicional implicará aumento vigoroso do consumo, no contexto de uma economia que já tem crescido ao ritmo de 3% ao ano, com a taxa de desemprego ainda bastante baixa, elevando salários à frente da produtividade. Isso resulta em pressões adicionais sobre os preços, também prejudicando a redução da inflação.
“Temos um cenário em que o juro fica mais alto do que se imaginava, bem como o dólar fica mais valorizado”
Obviamente, o Federal Reserve não deverá ficar inerte a esses desenvolvimentos. Pelo contrário, ou reduzirá a taxa de juros em ritmo menor, ou poderá decidir por encerrar o recém-iniciado processo de afrouxamento monetário, ou até mesmo voltando a aumentar o juro, ainda que hoje pareça ser um risco remoto.
Nesse sentido, aliás, os mercados de renda fixa, que chegaram a projetar queda na taxa básica de juros para algo perto de 3% ao ano, hoje trabalham com um patamar na vizinhança de 4% ao ano. Fica, portanto, mais interessante aplicar nos EUA do que em países comparáveis, o que leva ao fortalecimento do dólar em face das demais moedas, inclusive o real.
Falamos, portanto, de um cenário em que o juro fica mais alto do que se imaginava, bem como do dólar mais valorizado do que se esperava.
Não é uma combinação amigável para países emergentes de maneira geral, e certamente não é para o Brasil, onde parcela considerável da desvalorização da moeda — embora não a maior fatia — decorre disso. Agravando o problema, fica claro agora que a aposta da administração petista no forte aumento de gastos nos dois primeiros anos de governo, contando com o ambiente internacional complacente, se mostrou equivocada, um autêntico “pé trocado”.
Não há mais como reverter o processo, calcado na expansão do gasto permanente. O ministro da Fazenda, ironicamente ecoa seu antecessor, prometendo o ajuste fiscal para “a próxima quinta-feira”, mas a verdade é que não há vontade do comando político nem condições objetivas de avançarmos nessa frente.
Publicado em VEJA de 15 de novembro de 2024, edição nº 2919
 
                 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										 
 										







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